«Antes de falar de S. Tomás, antes de falar do tomismo, antes de ensinar, é preciso contemplar: contemplar o mestre, compreender para além do pensamento intelectual o que o mestre viveu e o que ele nos quis dizer», afirmou o Papa Francisco dirigindo-se aos participantes no xi Congresso tomístico internacional, recebidos em audiência na manhã de 22 de setembro, na sala Clementina. O Congresso — promovido pela Pontifícia academia de S. Tomás de Aquino e pelo Instituto tomístico “Angelicum” — teve como tema: «Vetera novis augere. Os recursos da tradição tomista no contexto atual». Os trabalhos decorreram em Roma, de 19 a 24 de setembro, na sede da Pontifícia universidade de S. Tomás de Aquino. Depois de ter entregado aos presentes o discurso preparado para a ocasião, o Papa Francisco improvisou as seguintes palavras.
Gosto deste encontro, depois de tantos anos, porque se trata de refletir sobre um mestre. Às vezes, quando se medita sobre uma pessoa que foi criadora de escolas, filosóficas ou teológicas, corre-se o risco de instrumentalizar o mestre para dizer aquilo que me parece, e foi o que aconteceu com o tomismo. Muitas interpretações — penso numa, por exemplo — casuísticas do tomismo, que foi escravo do pensamento casuístico. Lembro-me de um espanhol que escreveu muitos livros, um tipo chamado Losada, acho que era assim que se chamava, não me recordo bem, que para explicar o “contínuo metafísico” segundo S. Tomás, inventou os “puncta inflata”. Assim, uma interpretação de tipo casuístico, de tipo oportunista, diminui e torna ridículo o pensamento do mestre.
Quando queremos explicar o pensamento de um mestre, o primeiro passo é a contemplação, para sermos recebidos naquele pensamento magisterial. O segundo, com timidez, é a explicação. E no final, com muita cautela, a interpretação, mas com muita cautela. O mestre é grande, o mestre é alguém que faz escola, que criou uma escola. O mestre é alguém que põe em movimento toda uma corrente de pensamentos. Nunca usar o mestre para aquilo que penso, mas colocar o que penso à luz do mestre, que seja a luz do mestre a interpretar isto.
Permito-me contar-vos a experiência de um dominicano. No Sínodo sobre a família havia pontos que não eram claros sobre a doutrina católica e também interpretações de S. Tomás que não eram claras. Naquela época, entre nós havia realmente discussão, porque não conseguíamos encontrar o caminho. Foi um dominicano, o Cardeal Schönborn, que nos deu uma lição de tomística — mas de alto nível! — pois compreendia Tomás e explicou-o sem o usar, com grandeza. Vivemos a experiência daquele grande dominicano, que foi Secretário da Congregação para a Doutrina da Fé. Haveria outras..., mas quero mencionar esta. Por um lado, muitas interpretações que reduzem o pensamento do mestre, e depois a experiência de alguém que o esclareceu: “Não, Tomás diz isto”, e comprovado pelo que dizia. Isto é maravilhoso, isto é algo grandioso!
Por isso, peço-vos: antes de falar de S. Tomás, antes de falar do tomismo, antes de ensinar, é preciso contemplar: contemplar o mestre, compreender para além do pensamento intelectual o que o mestre viveu e o que o mestre nos quis dizer. O sinal é quando reduzo a figura de um mestre à figura de um pensador, arruíno o pensamento; tiro-lhe a força, tiro-lhe a vida. E S. Tomás foi uma luz para o pensamento da Igreja, e devemos defendê-lo de todos estes “reducionismos intelectualistas” que aprisionam a grandeza do seu pensamento magisterial.
Era isto que eu vos queria dizer, para além do discurso que cada um de vós recebeu. Mas eu só queria dizer-vos isto: é um mestre, não um intelectual como muitos, não, é diferente!
Muito obrigado! E agora gostaria de vos conceder a bênção e depois saudar aqueles que quiserem. Se alguém não me quiser saudar, não o obrigo!