«Pastores pobres de bens, mas ricos de Evangelho»: os bispos e os sacerdotes que sofreram duras perseguições são o modelo ideal indicado pelo Papa Francisco à comunidade do Pontifício Colégio Pio Romeno, recebida em audiência na manhã de 19 de maio, na Sala do Consistório, por ocasião do 85º aniversário de fundação.
Prezados irmãos e irmãs!
Tenho o prazer de vos dar as boas-vindas por ocasião do 85º aniversário de fundação do Colégio Pio Romeno. Saúdo todos vós, Superiores da Congregação para as Igrejas Orientais, sacerdotes, estudantes e funcionários do Colégio, e agradeço ao Reitor, Padre Gabriel, as palavras que me dirigiu em vosso nome.
Há dois anos, durante a Divina Liturgia que presidi em Blaj, no Campo da Liberdade, encorajei a resistir às novas ideologias que procuram impor-se e desenraizar os povos, às vezes de modo dissimulado, das suas tradições religiosas e culturais. Durante aquela celebração, proclamei Beatos sete Bispos mártires, indicando-os como exemplos para todo o povo romeno. Vós, aqui em Roma, na cidade que conserva o testemunho de Pedro, de Paulo e de muitos outros Mártires, podeis redescobrir de modo completo as vossas raízes, através do estudo e da meditação. É uma preciosa oportunidade para refletir sobre o modo como as raízes se formaram. Durante a segunda guerra mundial, quando a Igreja greco-católica romena já não tinha Bispos ativos, pois tinham sido mortos ou presos, o Bispo Ioan Ploscaru de Lugoj, na prisão por quinze anos, escreveu no seu diário: «Os sacerdotes e os Bispos da Igreja greco-católica consideraram este período como o mais precioso da sua existência. É uma graça poder oferecer a Deus os próprios sofrimentos e o testemunho da própria fé, até à custa da vida». Quem dá a vida pelo Evangelho pensa assim, abraça a resposta de Deus ao mal do mundo: entrega-se, imita o amor manso e gratuito do Senhor Jesus, que se oferece por quem está próximo ou distante. Esta é a fonte que permitiu que as raízes afundassem na terra, crescessem fortes e dessem frutos. E vós sois esse fruto.
Caros amigos, sem alimentar as raízes, todas as tradições religiosas perdem a fecundidade. Com efeito, verifica-se um processo perigoso: à medida que o tempo passa, as pessoas concentram-se cada vez mais em si mesmas, na própria pertença, perdendo o dinamismo das origens. Então, focalizam-se nos aspetos institucionais, externos, na defesa do seu grupo, da sua história e dos seus privilégios, perdendo, talvez sem o perceber, o sabor do dom. Permanecer na metáfora é como parar para fitar o tronco, os ramos e as folhas, esquecendo que tudo é mantido pelas raízes. Mas só se as raízes forem bem regadas a árvore continuará a crescer de modo frondoso; caso contrário, dobra-se em si mesma e morre. Isto acontece quando nos acomodamos e somos atingidos pelo vírus da mundanidade espiritual, o pior mal que pode acontecer na Igreja: a mundanidade espiritual. Então, definhamos numa vida medíocre, autorreferencial feita de arrivismos, escaladas, busca de satisfações pessoais e prazeres fáceis. A atitude de quem procura escalar, ter poder, possuir dinheiro, ser famoso, sentir-se confortável, fazer carreira. Isto significa querer crescer sem raízes. É verdade que há outros que vão às raízes para ali se esconder, pois têm medo do crescimento. É verdade! Às raízes vai-se para obter a força, beber a linfa e continuar a crescer. Não se pode viver nas raízes e não se pode viver na árvore sem as raízes. A tradição é um pouco a mensagem que recebemos das raízes: é o que nos dá força para continuar, hoje, sem repetir as coisas de ontem, mas com a mesma força da primeira inspiração.
Aqui em Roma, além de aprofundar as raízes, tendes a oportunidade de pensar no modo como as atualizar, para que o vosso ministério não seja uma repetição estéril do passado, nem uma manutenção do presente, mas seja frutuoso e olhe em frente. E este é o segredo da fecundidade, é o mesmo daqueles Bispos e sacerdotes: ou seja, o dom da vida, o Evangelho a pôr em prática com o coração de pastores. Penso no Cardeal Mureşan, que daqui a poucos dias completará 91 anos: anos de serviço no sacerdócio, iniciado há quase sessenta anos numa humilde cave, depois que os Bispos sobreviventes foram libertados da prisão. Pastores pobres de bens, mas ricos de Evangelho. Sede assim, apóstolos alegres da fé que herdastes, dispostos a nada guardar para vós mesmos, prontos a reconciliar-vos com todos, a perdoar e a tecer a unidade, superando todo o ressentimento e vitimismo. Então também a vossa semente será evangélica e dará frutos. Sem esquecer o passado, mas vivendo no presente, com fecundidade.
Depois das raízes, gostaria de dizer algo também sobre o terreno. Enquanto estudais, não vos esqueçais do bom terreno da fé. É aquele lavrado pelos vossos avós, pelos vossos pais, do santo Povo fiel de Deus. Enquanto vos preparais para transmitir a fé, pensai neles e lembrai-vos que o Evangelho não se anuncia com palavras complicadas, mas com a linguagem do povo, como nos ensinou Jesus, Sabedoria encarnada: transmite-se “em dialeto”, no dialeto do povo de Deus, que o povo entende, com simplicidade. Por favor, tomai cuidado para não vos tornardes “clérigos de Estado”, sede pastores do povo: proximidade ao povo do qual provindes. Paulo dizia a Timóteo: “Lembra-te da tua mãe e da tua avó”. Das tuas raízes, do povo a que pertences. E o profeta Samuel dizia ao rei David: “Lembra-te que foste eleito precisamente pelo rebanho: não te esqueças da grei que te elegeu”; é a tua primeira pertença. O autor da Carta aos Hebreus recomenda-nos: “Lembrai-vos dos vossos antepassados, daqueles que vos anunciaram a Palavra de Deus”. Por favor, não vos esqueçais do povo do qual provindes. Não sejais sacerdotes de laboratório teológico, não! Presbíteros do povo, com o cheiro do povo, com o cheiro do rebanho. Eu disse que o Evangelho não se anuncia com palavras complicadas, mas “em dialeto”. O bom terreno é também aquele que nos faz tocar a carne de Cristo, presente nos pobres, nos doentes, em quantos sofrem, nos pequeninos e nos simples, em quem sofre e onde Jesus está presente, nos descartados, nesta cultura do descarte na qual temos que viver. Penso, em particular, nos numerosos refugiados da vizinha Ucrânia, que também a Roménia recebe e ajuda.
Gostaria de dizer uma palavra também a vós, estimados estudantes de língua árabe, pertencentes ao antigo Colégio de Santo Efrém. Há cerca de dez anos, formais uma única comunidade. A vossa partilha de vida não deve ser sentida como uma diminuição dos respetivos traços distintivos, mas como fecunda promessa de futuro. Os colégios nacionais, orientais e latinos, não devem ser “enclaves”, para onde regressar após o dia de estudos, para viver como se fosse na pátria, mas devem ser laboratórios de comunhão fraterna, onde se experimenta a autêntica catolicidade, a universalidade da Igreja. Esta universalidade é o ar bom para respirar, a fim de não cair em particularismos que impedem a evangelização.
As raízes, o terreno, o ar bom. Desejo-vos que cultiveis assim a vossa vocação durante os anos romanos. E peço-vos, por favor, que rezeis por mim. Agora abençoo-vos de coração, bem como os vossos entes queridos. Obrigado!