· Cidade do Vaticano ·

Mensagem do Papa no aniversário do início do conflito na Síria

Não estais esquecidos

 Não estais esquecidos  POR-012
22 março 2022

«Embora a guerra na Síria, agora no seu décimo segundo ano, continue a causar sofrimento, fome, morte e a fuga contínua de sírios, fazem-se grandes esforços para oferecer esperança e perspetivas futuras aos que permanecem. O presente congresso é uma oportunidade para dizer à comunidade cristã: “Não estais esquecidos”», garantiu o Papa Francisco — através de uma mensagem dirigida ao cardeal Leonardo Sandri, prefeito da Congregação para as Igrejas orientais — aos participantes na conferência «Igreja, casa da caridade — Sinodalidade e coordenação», inaugurada a 15 de março em Damasco.

Organizada pela Igreja católica da Síria, sob os auspícios do núncio apostólico, cardeal Mario Zenari, e do Dicastério oriental, através da Roaco (Reunião das obras de ajuda às Igrejas orientais), os trabalhos concluíram-se a 17 de março.

Olhando para a dramática situação atual do conflito na Europa oriental, Francisco acrescentou: «Nestes dias de guerra e imenso sofrimento para os nossos irmãos e irmãs na Ucrânia, abracemo-los na oração e no afeto, confiando que em breve se alcançará uma paz justa e duradoura, para que o trabalho das agências possa ser realizado naquela amada nação, tal como acontece hoje na Síria».

Na capital síria, o cardeal Sandri foi acompanhado pelo arcebispo Giampietro Dal Toso, secretário da Congregação para a evangelização dos povos, encarregado das Pontifícias obras missionárias, pelos monsenhores Marco Formica da secção para as Relações com os Estados da Secretaria de Estado, e Kuriakose Cherupuzhathathathil, oficial da Congregação para as Igrejas orientais e secretário da Roaco, e pelos doutores Pascal Debbane e Alessio Pecorario, do Dicastério para o serviço do desenvolvimento humano integral.

Na abertura da conferência, depois da oração e introdução iniciais, a mensagem do Santo Padre foi lida em árabe. Seguiram-se saudações do patriarca grego Melquita Youssef Absi, do patriarca sírio Youssef Younan, do patriarca caldeu cardeal Louis Raphaël i Sako, dos cardeais Sandri e Mario Zenari, do secretário do comité organizador, D. Antoine Audo, e do ministro dos Assuntos religiosos do governo sírio.

O cardeal Sandri, depois de reconstruir a génese do congresso, disse: «Hoje o sonho de um momento sinodal da Igreja católica na Síria já se realizar nas suas diferentes expressões rituais, com a presença de consagrados e leigos». E «a nossa presença aqui, apesar das muitas dificuldades, é um sinal de esperança que gera admiração. Ajuda-nos e pede-nos que discernamos o presente, e que continuemos a desejar o futuro para este país amado e atormentado, recordando hoje o aniversário do início do conflito que o prostrou e cujas consequências se tornaram já intoleráveis». E acrescentou: «Carregando os fardos uns dos outros, durante muito tempo — também devido às dificuldades de circulação e às numerosas restrições — muitos dos vossos bispos viajaram para a Europa e outros países a fim de oferecer o testemunho do vosso sofrimento e obter ajuda para que a Igreja pudesse continuar a sua missão durante a guerra. Agora chegou o momento em que podemos regressar a uma comunhão mais ampla dentro de cada Igreja em particular».

O patriarca Absi salientou o esforço que todos os participantes, da Síria e do estrangeiro, fizeram para poder estar na Conferência. «No entanto, queremos expressar, oferecendo algo de nós mesmos, o amor de Deus por cada homem. O esforço que faremos para aprender a trabalhar em conjunto dará maior eficácia ao nosso testemunho», disse, sublinhando o desejo, como povo, «de voltar a ser capaz de acolher o próximo, como fomos capazes de fazer face aos dramas das últimas décadas provocados por vários conflitos». O desejo de paz, acrescentou o patriarca, é também «poder voltar a ser uma ajuda para os outros à nossa volta», reconstruindo «pontes de amor sobre os escombros do ódio, aprendendo todos os dias a reconhecer-nos como “todos irmãos”», concluiu.

O patriarca Younan, recordando que a 15 de março foi o aniversário do início da guerra na Síria, que trouxe tanto sofrimento e devastação, chamou a atenção para as gerações mais jovens.

O patriarca Sako, agradecendo o acolhimento recebido, partilhou a sua experiência no Iraque, onde os cristãos, especialmente após a triste página do Estado islâmico (Ei), foram chamados a viver em primeira pessoa e de forma radical o pedido evangélico de amar os próprios inimigos.

O cardeal Zenari referiu-se à expressão de ser Igreja em saída, de o fazer juntos, como o Bom Samaritano. «Isto impede-nos de nos afastarmos do sofrimento do irmão, contando os números impressionantes dos anos de guerra no país», disse, explicando que «devemos aprender a oferecer todos os dias, juntos, os cinco pães e os dois peixes que podem parecer pouco», tentando ver a situação «com os olhos de Deus, vivendo a caridade». Por fim, o cardeal recordou as palavras de Santo Inácio de Antioquia, «que pede aos cristãos que não esqueçam na oração a amada Igreja de Cristo na Síria».

O bispo Audo, referindo-se à história daquelas terras, salientou como o domínio otomano «durante um longo período de tempo favoreceu o crescimento de uma mentalidade quase sectária, correndo cada comunidade o risco de ficar confinada em si mesma e, por sua vez, favorecendo um certo individualismo». Sucessivamente, prosseguiu, «a modernidade e os direitos humanos colocaram novos desafios aos cristãos e às sociedades».

O relatório central do primeiro dia foi confiado ao arcebispo Dal Toso, que orientou a reflexão dos presentes sobre algumas notas teológicas e pastorais para viver a caridade.

No final, dois testemunhos: o gravado, de dois frades menores que permaneceram a única presença ministerial entre os cristãos que não são apenas católicos na região de Idlib, cerca de 600 pessoas. E outro escrito por um muçulmano, agradecendo aos cristãos porque fazem sentir que «Jesus está no meio de nós».

O dia concluiu-se com um concerto interpretado pelo coro de cerca de cem crianças na catedral melquita de Damasco. O cardeal Sandri, citando as palavras de uma canção, definiu a presença dessas vozes «um raio de sol» que ilumina e dá esperança às noites da Síria.