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No relatório inaugural Francisco ofereceu uma “pequena colheita” de mais de 50 anos de experiência no ministério presbiteral

Sem a missa e a oração o sacerdote é apenas um operário cansado

 Sem a missa e a oração  o sacerdote é apenas um operário cansado  POR-008
22 fevereiro 2022

Foi o cardeal Marc Ouellet, prefeito da Congregação para os bispos, quem apresentou ao Papa Francisco os objetivos do Simpósio internacional “Para uma teologia fundamental do sacerdócio”, aberto na manhã 17 de fevereiro pelo próprio Pontífice, na Sala Paulo vi. O simpósio, que continuou até 19 de fevereiro, foi promovido pelo próprio purpurado e pelo Centro de investigação e antropologia das vocações, por ele fundado em novembro de 2020.  «Fé e sacerdócio hoje» foi o tema do discurso de abertura do Papa Bergoglio, seguido de discursos do dominicano Serge-Thomas Bonino sobre «Religião e sacerdócio: um facto antropológico fundamental» e de Robert Vorholt sobre os «fundamentos bíblicos da relação entre o sacerdócio dos batizados e o ministério apostólico».

Queridos irmãos, bom dia!

Agradeço-vos a oportunidade de partilhar convosco esta reflexão, nascida daquilo que o Senhor, pouco a pouco, me deu a conhecer durante os meus 52 anos de sacerdócio. Nesta grata recordação, não quero deixar de fora os sacerdotes que desde a minha infância me mostraram, com a sua vida e o seu testemunho, os traços do rosto do Bom Pastor. Meditando sobre o que poderia partilhar convosco da vida atual do sacerdote, cheguei à conclusão de que a melhor palavra deriva do testemunho que recebi de tantos padres ao longo dos anos. O que vos proponho resulta de um exercício de refletir sobre eles, individuando e contemplando as caraterísticas distintivas que lhes davam força, alegria e esperança singulares na sua missão pastoral.

Simultaneamente devo dizer o mesmo daqueles irmãos sacerdotes que tive de acompanhar porque perderam o fogo do primeiro amor, tornando-se estéril, repetitivo e quase sem sentido o seu ministério. Na sua vida, o sacerdote atravessa condições e momentos diferenciados; pessoalmente, passei por variadas condições e momentos e, ao “ruminar” as moções do Espírito, constatei que nalgumas situações, incluindo os momentos de provação, dificuldade e desolação, quando vivia e partilhava de uma determinada forma a vida, a paz permanecia. Estou ciente de que muito se poderia dizer e teorizar sobre o sacerdócio; mas hoje desejo circunscrever esta minha partilha convosco a esta “pequena colheita”, para que o sacerdote atual possa, independentemente do momento que esteja a viver, experimentar a paz e a fecundidade que o Espírito quer dar. Não sei se estas reflexões são o “canto do cisne” da minha vida sacerdotal, mas posso certamente assegurar que provêm da minha experiência. Não dou teorias; falo daquilo que vivi.

O tempo que estamos a viver requer, de nós, que não ignoremos a mudança, mas, ao contrário, nos abramos a ela com a consciência de estarmos perante uma mudança epocal (já o disse noutras ocasiões). E, se ainda tínhamos dúvidas, a Covid tornou isto mais do que evidente: de facto, a sua irrupção é muito mais que uma questão de saúde, muito mais do que uma constipação.

A mudança apresenta-nos sempre diferentes modos de a enfrentar. O problema é que, se muitas ações e atitudes podem ser úteis e boas, nem todas elas têm sabor de Evangelho. Aqui está o nó que devemos discernir: a mudança e a ação têm sabor de Evangelho ou não? É o caso, por exemplo, de procurar formas codificadas, frequentemente ancoradas no passado, que nos “garantem” uma espécie de proteção contra os riscos, refugiando-nos num mundo ou numa sociedade que já não existe (se é que alguma vez existiu!), como se uma tal ordem fosse capaz de pôr fim aos conflitos que a história nos apresenta. É a crise de recuar à procura de refúgio.

Outra atitude pode ser um otimismo exagerado: «vai correr tudo bem»! Seguir em frente sem discernimento e sem as decisões necessárias. Este otimismo acaba por ignorar os feridos desta transformação, não consegue aceitar as tensões, complexidades e ambiguidades próprias do tempo presente e “consagra” a última novidade como aquilo que é verdadeiramente real, desprezando assim a sabedoria dos anos. São dois tipos de fuga, que fazem lembrar as atitudes do mercenário que vê vir o lobo e foge: foge para o passado ou foge para o futuro. Mas nenhuma destas atitudes leva a soluções amadurecidas. O hoje concreto: é aqui que nos devemos deter.

Ao contrário, gosto da atitude que nasce da decisão de ocupar-se confiadamente da realidade, ancorando-se na sábia Tradição viva e vivente da Igreja, que permite fazer-se ao largo sem medo. Neste momento histórico, sinto que Jesus nos convida mais uma vez a «fazer-se ao largo» (cf. Lc 5, 4) com a confiança de que Ele é o Senhor da história e, guiados por Ele, poderemos discernir o horizonte para onde tender. A nossa salvação não é assética, a partir de laboratório ou de espiritualismos desencarnados (estamos sempre perante a tentação do gnosticismo, que é moderna, é atual); discernir a vontade de Deus significa aprender a interpretar a realidade com os olhos do Senhor, sem necessidade de fugir daquilo que acontece ao nosso povo na situação real onde vive e sem aquela ansiedade que induz a procurar uma saída rápida e tranquilizante guiada pela ideologia do momento ou por uma resposta pré-fabricada, ambas incapazes de se ocuparem dos momentos mais difíceis e até obscuros da nossa história. Estas duas vias levar-nos-iam a negar «a nossa história de Igreja, que é gloriosa por ser história de sacrifícios, de esperança, de luta diária, de vida gasta no serviço, de constância no trabalho fadigoso» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 96).

Em tal contexto, a própria vida sacerdotal ressente-se deste desafio; sintoma disso é a crise vocacional que, em várias partes, preocupa as nossas comunidades. Mas também é verdade que muitas vezes isso se fica a dever à ausência de fervor apostólico contagiante nas comunidades, acabando por não entusiasmar nem suscitar atração: são comunidades que até funcionam, por exemplo bem organizadas, mas sem entusiasmo; está tudo em ordem, mas falta o fogo do espírito. Onde houver vida, fervor, anseio de levar Cristo aos outros, surgem vocações genuínas. Mesmo em paróquias onde os sacerdotes não aparecem muito empenhados e alegres, é a vida fraterna e fervorosa da comunidade que desperta o desejo de se consagrar inteiramente a Deus e à evangelização, sobretudo se esta comunidade vivaz reza insistentemente pelas vocações e tem a coragem de propor aos seus jovens um caminho de especial consagração. Quando caímos no funcionalismo, quando tudo é organização pastoral e nada mais, isto não atrai de maneira alguma; mas quando há o padre ou a comunidade que tem o tal fervor cristão, batismal, então há a atração de novas vocações.

A vida de um sacerdote é, antes de mais nada, a história de salvação de um batizado. O Cardeal Ouellet falou da distinção entre sacerdócio ministerial e batismal. Às vezes esquecemos o Batismo, e o sacerdote torna-se uma função: é o funcionalismo. E isto é perigoso! Nunca devemos esquecer que cada vocação específica, incluindo esta ao sacramento da Ordem, é realização do Batismo. É sempre uma grande tentação viver um sacerdócio sem Batismo: existem estes sacerdotes “sem Batismo”, isto é, sem a memória de que a nossa primeira vocação é à santidade. Ser santo significa conformar-se a Jesus, deixando a nossa vida palpitar com os seus próprios sentimentos (cf. Fl 2, 5). Só quando se procura amar como Jesus amou é que tornamos Deus visível e, consequentemente, realizamos a nossa vocação à santidade. Com toda a razão nos lembrava São João Paulo ii que «o sacerdote, como a Igreja, deve crescer na consciência da sua permanente necessidade de ser evangelizado» (Exort. ap. pós-sin. Pastores dabo vobis, 25 de março de 1992, 26). Tenta ir dizer a um bispo, a um sacerdote que deve ser evangelizado. Não compreendem! Isto sucede. É o drama de hoje.

Cada vocação específica deve ser submetida a este tipo de discernimento. A nossa vocação é, antes de tudo, uma resposta Àquele que nos amou primeiro (cf. 1 Jo 4, 19). E aqui está a fonte da esperança, pois, mesmo no meio da crise, o Senhor não cessa de amar e, por conseguinte, de chamar. E disto é testemunha cada um de nós: um dia o Senhor encontrou-nos onde estávamos e como estávamos, em ambientes contrários ou situações familiares complexas. Gosto de reler Ezequiel 16 e às vezes sinto-me identificado: encontrou-me aqui, encontrou-me assim, e levou-me para diante… Mas isto não O dissuadiu do desígnio de escrever, por meio de cada um de nós, a história da salvação. E foi assim desde o início; pensemos em Pedro e Paulo, em Mateus... só para nomear alguns. O facto de os ter escolhido não deriva de uma opção ideal, mas de um compromisso concreto com cada um deles. Cada um, olhando para a própria humanidade, a própria história, a própria índole, não se deve perguntar se uma escolha vocacional é conveniente ou não, mas se, em consciência, aquela vocação desvenda nele o potencial de Amor recebido no dia do próprio Batismo.

Ao longo destes períodos de mudança, muitas são as dúvidas a enfrentar e também as tentações que hão de vir. Por isso, nesta minha intervenção, quero deter-me simplesmente naquilo que sinto ser decisivo para a vida de um sacerdote hoje, tendo presente o que diz Paulo: «É n’Ele [em Cristo] que toda a construção bem ajustada cresce para formar um templo santo, no Senhor» (Ef 2, 21). Crescer bem ajustada significa crescer em harmonia; mas só o Espírito Santo nos pode fazer crescer em harmonia, segundo a definição tão bela que dava d’Ele São Basílio: «Ipse harmonia est» (Tratado «Sobre o Espírito Santo, n. 38). Assim, pensei que toda a construção, para se manter de pé, precisa de sólidos alicerces; quero, pois, partilhar convosco as atitudes que dão solidez à pessoa do sacerdote; quero partilhar (vós já o ouvistes, mas repito-o uma vez mais!) as quatro colunas constitutivas da nossa vida sacerdotal, a que chamaremos as «quatro proximidades», pois seguem o estilo de Deus, que é fundamentalmente um estilo de proximidade (cf. Dt 4, 7). Assim Se define a Si próprio, colocando estas palavras na boca do seu povo: «Que grande nação haverá que tenha um deus tão próximo de si como está próximo de nós o Senhor, nosso Deus sempre que O invocamos?» O estilo de Deus é proximidade, é uma proximidade especial, compassiva e terna. As três palavras que definem a vida de um sacerdote (e também de um cristão), porque são tiradas precisamente do estilo de Deus: proximidade, compaixão e ternura.

Já me referi a isto no passado; hoje, porém, quero deter-me mais longamente, porque o sacerdote, mais do que de receitas ou teorias, precisa de instrumentos concretos para acometer o seu ministério, a sua missão e a sua vida quotidiana. São Paulo exortava Timóteo a manter vivo o dom de Deus que recebera pela imposição das mãos dele, pois Deus não nos concedeu um espírito de timidez, mas de fortaleza, amor e sobriedade (cf. 2 Tm 1, 6-7). Julgo que estas quatro colunas, estas quatro «proximidades» de que vou falar agora podem ajudar, de forma prática, concreta e esperançosa, a reavivar o dom e a fecundidade que um dia nos foram prometidos, e a conservar vivo aquele dom.

Em primeiro lugar, a proximidade com Deus. Quatro proximidades, e a primeira é a proximidade com Deus.

Proximidade com Deus

Por outras palavras, proximidade com o Senhor próximo. «Eu sou a videira; vós, os ramos (João diz isto no seu Evangelho a propósito de «permanecer»). Quem permanece em mim e Eu nele, esse dá muito fruto, pois, sem mim, nada podeis fazer. Se alguém não permanece em mim, é lançado fora, como um ramo, e seca. Esses são apanhados e lançados ao fogo, e ardem. Se permanecerdes em mim e as minhas palavras permanecerem em vós, pedi o que quiserdes, e assim vos acontecerá» (Jo 15, 5-7).

O sacerdote é convidado, antes de mais nada, a cultivar esta proximidade, a intimidade com Deus, e desta relação poderá haurir todas as forças necessárias para o seu ministério. A relação com Deus é, por assim dizer, o enxerto que nos mantém dentro de uma ligação de fecundidade. Sem uma relação significativa com o Senhor, o nosso ministério tende a tornar-se estéril. A proximidade com Jesus, o contacto com a sua Palavra, permite-nos comparar a nossa vida com a d’Ele e aprender a não nos escandalizarmos com nada do que nos acontece, a defender-nos dos «escândalos». Como sucedeu com o Mestre, passareis por momentos de alegria e festas nupciais, milagres e curas, multiplicação de pães e descanso. Haverá momentos em que poder-se-á ser louvado, mas virão horas também de ingratidão, rejeição, dúvida e solidão, a ponto de ter que dizer: «Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?» (Mt 27, 46).

A proximidade com Jesus convida-nos a não temer nenhuma destas horas, não porque somos fortes, mas porque olhamos para Ele e agarramo-nos a Ele, dizendo-lhe: «Senhor, não permitais que eu caia em tentação! Fazei-me compreender que estou a viver um momento importante na minha vida e que Vós estais comigo para provar a minha fé e o meu amor» ( C. M. Martini , La fuerza de la debilidad. Reflexiones sobre Job, Salterrae 2014, 84). Por vezes esta proximidade com Deus assume a forma de uma luta: havemos de lutar com o Senhor sobretudo nos momentos em que a sua ausência se faz sentir mais na vida do sacerdote ou na vida das pessoas a ele confiadas; lutar toda a noite e pedir a sua bênção (cf. Gn 32, 25-27), que será fonte de vida para muitos. Às vezes é uma luta. Contava-me um padre jovem, que trabalha aqui na Cúria: tem um trabalho difícil, ou seja, pôr um lugar em ordem e à noite voltava cansado. Voltava cansado, mas repousava antes de ir para a cama diante de Nossa Senhora com o terço na mão. Ele, um curial, um funcionário do Vaticano, precisava desta proximidade. Criticam-se muito as pessoas da Cúria, e às vezes com verdade; mas eu posso dizer também e dar testemunho de que aqui dentro há santos. Isto é verdade!

Muitas crises sacerdotais têm origem precisamente numa escassa vida de oração, numa falta de intimidade com o Senhor, numa redução da vida espiritual a mera prática religiosa. Quero distinguir isto, mesmo na formação: uma coisa é a vida espiritual, outra é a prática religiosa. «Como está a tua vida espiritual?» — «Bem, está bem! Faço a meditação de manhã, rezo o terço, rezo a “sogra” (a sogra é o breviário), rezo o breviário e tudo... Faço tudo». Não! Isto é prática religiosa. Mas como está a tua vida espiritual? Recordo momentos importantes da minha vida em que esta proximidade com o Senhor foi decisiva para me manter de pé, aguentar-me nos momentos escuros. Sem a intimidade da oração, da vida espiritual, da proximidade concreta com Deus através da escuta da Palavra, da Celebração Eucarística, do silêncio da adoração, da consagração a Maria, do sábio acompanhamento de uma guia, do sacramento da Reconciliação… sem estas «proximidades» concretas, um sacerdote não passa, por assim dizer, de um trabalhador cansado que não se aproveita dos benefícios dos amigos do Senhor. Na outra diocese, gostava de perguntar aos padres, que me contavam os seus trabalhos: «Diz-me?! Como vais tu para a cama?» E não percebiam a pergunta. «Sim! À noite, como vais para a cama?» — «Chego cansado, como qualquer coisa e vou para a cama, e lá vejo a televisão que está na frente...» — «Mas como? Não passas sequer junto do Senhor, ao menos para lhe dar a boa noite?». Aqui está o problema... Falta de proximidade. Era habitual o cansaço do trabalho, ir descansar e ver televisão — o que é lícito — mas sem o Senhor, sem esta proximidade, não está bem! Rezara o terço, rezara o breviário, mas sem a intimidade com o Senhor. Não sentia a necessidade de dizer ao Senhor: “Adeus! Até amanhã! Muito obrigado!”. São pequenos gestos que revelam o comportamento de uma alma sacerdotal.

Por exemplo, na vida sacerdotal, muitas vezes pratica-se a oração apenas como um dever, esquecendo que a amizade e o amor não podem ser impostos como uma regra externa, mas são uma opção fundamental do nosso coração. Um sacerdote que reza permanece, radicalmente, um cristão que compreendeu profundamente o dom recebido no Batismo. Um padre que reza é um filho que se lembra continuamente de ser filho e ter um Pai que o ama. Um padre que reza é um filho que se aproxima do Senhor.

Mas tudo isto é difícil se não se está habituado a ter espaços de silêncio ao longo do dia. Se não se sabe largar o «fazer» de Marta, para aprender o «estar» de Maria. Custa a renunciar ao ativismo — muitas vezes o ativismo pode ser uma fuga — porque quando cessamos de nos atarefar, não vem logo ao coração a paz, mas a desolação; e, para não entrar em desolação, estamos dispostos a nunca parar. O trabalho é uma distração, para não entrar na desolação. Mas desolação é de certo modo o ponto de encontro com Deus. É justamente aceitando a desolação que vem do silêncio, do jejum de atividades e palavras, da coragem de nos examinarmos com sinceridade... é precisamente nessa situação que tudo ganha uma luz e uma paz que já não assentam sobre as nossas forças e capacidades. Trata-se de aprender a deixar que o Senhor continue a realizar a sua obra em cada um e corte tudo o que é infecundo, estéril, e que distorce a vocação. Perseverar na oração significa mais do que permanecer fiéis a uma prática: significa não fugir quando a própria oração nos conduz ao deserto. O caminho do deserto leva à intimidade com Deus, mas sob condição de não fugir, não encontrar formas para escapar deste encontro. Hei de conduzi-lo ao deserto «para lhe falar ao coração»: diz o Senhor ao seu povo, pela boca do profeta Oseias (cf. 2, 16). Aqui está uma coisa acerca da qual se deve questionar o sacerdote: é capaz de se deixar levar ao deserto? Os guias espirituais, aqueles que acompanham os sacerdotes, devem compreender, ajudando-os a porem-se esta pergunta: és capaz de te deixar levar ao deserto? Ou vais logo para o oásis da televisão ou doutra coisa qualquer?

A proximidade com Deus permite-nos, a nós sacerdotes, tomar contacto com o sofrimento que existe no nosso coração e, se aceite, nos desarma até ao ponto de tornar possível um encontro. A oração que, como fogo, anima a vida sacerdotal é o clamor de um coração contrito e arrependido, que o Senhor (assim no-lo diz a Palavra) não despreza (cf. Sl 51/50, 19). «Os justos clamaram e o Senhor atendeu-os \ e livrou-os das suas angústias. \ O Senhor está perto dos corações contritos \ e salva os espíritos abatidos» (Sl 34/33, 18-19).

Um sacerdote deve ter um coração suficientemente «ampliado» para dar espaço ao sofrimento do povo que lhe está confiado e ao mesmo tempo, como sentinela, anunciar a aurora da Graça de Deus que se manifesta precisamente naquele sofrimento. Abraçar, aceitar e apresentar a própria miséria na proximidade com o Senhor será a melhor escola para poder, pouco a pouco, dar espaço a toda a miséria e sofrimento que encontrar dia a dia no seu ministério, até ao ponto de se tornar ele mesmo como o coração de Cristo. E isto preparará o sacerdote também para outra proximidade: a proximidade com o Povo de Deus. Na proximidade com Deus, o sacerdote reforça a proximidade com o seu povo; e, vice-versa, na proximidade com o seu povo vive também a proximidade com o seu Senhor. E esta proximidade com Deus — chama-me a atenção — é a primeira tarefa dos bispos, porque quando os Apóstolos «inventam» os diáconos, Pedro depois explica a sua função e conclui assim: «E para nós — os bispos — fica a oração e o anúncio da Palavra» (cf. At 6, 4). Por outra palavras, a primeira tarefa do bispo é rezar; e isto vale também para o sacerdote: rezar.

«Ele é que deve crescer, e eu diminuir» (Jo 3, 30): dizia João Batista. A intimidade com Deus torna possível tudo isto, porque na oração se faz experiência de ser grande aos seus olhos, e então já não é um problema para os sacerdotes próximos do Senhor tornar-se pequenos aos olhos do mundo. E lá, naquela proximidade, já não assusta conformar-se a Jesus Crucificado, como nos é pedido no rito da ordenação sacerdotal, que é maravilhoso, mas esquecemo-lo frequentemente.

E passemos à segunda proximidade, que será mais breve do que a primeira.

Proximidade com o bispo

Durante muito tempo, esta segunda proximidade foi lida só de maneira unilateral. Muitas vezes na história da Igreja, e ainda hoje, se dá à obediência uma interpretação distante do sentir do Evangelho. A obediência não é um atributo disciplinar, mas a caraterística mais forte dos laços que nos unem em comunhão. Obedecer — neste caso, ao bispo — significa aprender a escutar, lembrando-se de que ninguém se pode arvorar em detentor da vontade de Deus e que esta há de ser compreendida apenas através do discernimento. Assim, a obediência é a escuta da vontade de Deus que se discerne precisamente numa ligação. Esta atitude de escuta permite maturar a ideia de que ninguém é o princípio e o fundamento da vida, mas cada qual deve necessariamente confrontar-se com os outros. Esta lógica das proximidades — neste caso com o bispo, mas vale também para as outras — permite vencer qualquer tentação de fechamento, de autojustificação e de vida de «solteiro», ou de «solteirão». Quando os padres se fecham, se vão fechando cada vez mais…, acabam «solteirões» com todas as manias dos «solteirões». E não é um belo espetáculo! Esta proximidade convida-nos, ao contrário, a fazer apelo a outras instâncias para encontrar o caminho que conduz à verdade e à vida.

O bispo não é um vigilante de escola, não é um vigiador, é um pai, e deveria proporcionar esta proximidade. Assim deve procurar comportar-se o bispo, porque senão afasta os padres, ou então só aproxima os ambiciosos. O bispo, seja ele quem for, permanece para cada presbítero e cada Igreja particular uma ligação que ajuda a discernir a vontade de Deus. Mas não devemos esquecer que o próprio bispo só pode ser instrumento deste discernimento se também ele se colocar à escuta da realidade dos seus presbíteros e do povo santo de Deus que lhe está confiado. Como escrevi na Exortação Evangelii gaudium, «precisamos de nos exercitar na arte de escutar, que é mais do que ouvir. Escutar, na comunicação com o outro, é a capacidade do coração que torna possível a proximidade, sem a qual não existe um verdadeiro encontro espiritual. Escutar ajuda-nos a individuar o gesto e a palavra oportunos que nos desinstalam da cómoda condição de espetadores. Só a partir desta escuta respeitosa e compassiva é que se podem encontrar os caminhos para um crescimento genuíno, despertar o desejo do ideal cristão, o anseio de corresponder plenamente ao amor de Deus e o anelo de desenvolver o melhor de quanto Deus semeou na nossa própria vida» (n. 171).

Não é por acaso que o maligno, para destruir a fecundidade da ação da Igreja, procura minar os nossos laços constitutivos. Defender os laços do presbítero com a Igreja particular, com o instituto a que pertence e com o bispo torna confiável a vida sacerdotal. Defender os laços. A obediência é a decisão fundamental de acolher quem está colocado à nossa frente como sinal concreto daquele sacramento universal de salvação que é a Igreja; obediência que pode ser também confrontação, escuta e, nalguns casos, tensão, mas não se separa. Isto requer necessariamente que os sacerdotes rezem pelos bispos e saibam exprimir, com respeito, coragem e sinceridade, o seu parecer. Requer, igualmente dos bispos, humildade, capacidade de escuta, de autocrítica e de se deixar ajudar. Se defendermos esta ligação, avançaremos com segurança no nosso caminho.

E creio que isto, relativamente à proximidade com os bispos, seja suficiente.

Proximidade entre presbíteros

É a terceira proximidade. Proximidade com Deus, proximidade com os bispos, proximidade com os presbíteros. Precisamente a partir da comunhão com o bispo é que se abre a terceira proximidade: a da fraternidade. Jesus manifesta-se onde há irmãos prontos a amarem-se: «Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles» (Mt 18, 20). Também a fraternidade, à semelhança da obediência, não pode ser uma imposição moral externa à pessoa. Fraternidade é optar deliberadamente por procurar ser santo com os outros, e não em solidão, santo com os outros. Um provérbio africano, que bem conheceis, diz: «Se queres chegar depressa, vai sozinho; se queres chegar longe, vai com os outros». Às vezes parece que a Igreja seja lenta — e é verdade — mas apraz-me pensar que seja a lentidão de quem decidiu caminhar em fraternidade; inclusive acompanhando os últimos, mas sempre em fraternidade.

As caraterísticas da fraternidade são as mesmas do amor. São Paulo, na primeira Carta aos Coríntios (cap. 13), deixou-nos um «guia» claro do amor, indicando-nos em certo sentido para onde deveria tender a fraternidade. Em primeiro lugar, aprender a paciência, que é a capacidade de nos sentir responsáveis pelos outros, carregar os seus fardos, de algum modo padecer com eles. O contrário da paciência é a indiferença, a distância que construímos entre nós e os outros para não nos sentir envolvidos com a sua vida. Em muitos presbíteros, vai-se consumando o drama da solidão, de se sentirem sozinhos. Sentimo-nos não dignos de paciência, de consideração; antes, parece que do outro nos venha o julgamento, não o bem, nem a benignidade. O outro é incapaz de se alegrar com o bem que nos acontece na vida, ou então sou eu que me sinto incapaz de me alegrar quando vejo o bem na vida dos outros. Esta incapacidade de se alegrar com o bem alheio, dos outros é a inveja — quero destacar isto — que tanto faz tribular os nossos ambientes e que constitui uma dura luta na pedagogia do amor, e não simplesmente um pecado a confessar. O pecado é a última coisa, é a atitude que é invejosa. A inveja está muito presente nas comunidades sacerdotais. E a Palavra de Deus diz-nos que é a atitude destrutiva: por inveja do diabo, entrou o pecado no mundo (cf. Sb 2, 24). É a porta, a porta para a destruição. E sobre isso devemos falar claramente: em nossos presbitérios, há inveja. Nem todos são invejosos. Isso não! Mas a tentação da inveja está sempre à espreita. Tenhamos cuidado. E, da inveja, provem a murmuração.

Para nos sentir parte da comunidade, do «nós», não é preciso usar máscaras que deem, de nós mesmos, apenas uma imagem vencedora. Ou seja, não precisamos de nos vangloriarmos, e menos ainda de nos orgulharmos ou, pior, assumir atitudes violentas, faltando ao respeito com quem nos rodeia. Há também formas clericais de bullying. Com efeito, se um sacerdote tem algo de que gloriar-se, é a misericórdia do Senhor; conhece o seu pecado, a sua miséria e os seus limites, mas experimentou que, onde abundou o pecado, superabundou o amor (cf. Rm 5, 20); e esta é a sua primeira boa nova. Um sacerdote que tenha isto presente, não é invejoso, não pode ser invejoso.

O amor fraterno não busca o próprio interesse, não deixa espaço à ira, ao ressentimento, como se o irmão ao meu lado me tivesse de algum modo defraudado em qualquer coisa. E, quando encontro a miséria do outro, estou pronto a não recordar para sempre o mal recebido, não fazer disso o único critério de julgamento, chegando porventura ao ponto de me alegrar com a injustiça quando a sua vítima é precisamente a pessoa que me fez sofrer. O amor verdadeiro compraz-se com a verdade e considera um pecado grave atentar contra a verdade e a dignidade dos irmãos através de calúnias, maledicências, murmurações. A origem está na inveja. Chega-se a isto, inclusive às calúnias, para se ganhar uma posição... E isto é muito triste. Quando daqui se pedem informações para se fazer bispo alguém, muitas vezes recebemos informações viciadas de inveja. E esta é uma doença dos nossos presbitérios. Muitos de vós são formadores nos Seminários. Tende isto em conta!

Entretanto, à luz disto, não se deve pensar que o amor fraterno seja uma utopia e, muito menos, um «tópico comum» para suscitar bons sentimentos ou palavras de circunstância ou um discurso tranquilizante. Não! Todos sabemos quão difícil possa ser a vida em comunidade ou no presbitério (havia um santo que dizia: a vida comunitária é a minha penitência)! Quão difícil é partilhar o dia a dia com aqueles que quisemos reconhecer como irmãos. Contudo, o amor fraterno, se não pretendermos edulcorá-lo, acomodá-lo, diminuí-lo, é a «grande profecia» que somos chamados a viver nesta sociedade do descarte. Apraz-me pensar no amor fraterno como um ginásio do espírito, onde dia a dia nos confrontamos connosco e temos o termómetro da nossa vida espiritual. Hoje a profecia da fraternidade permanece viva e tem necessidade de arautos; precisa de pessoas que, cientes das próprias limitações e das dificuldades surgidas, se deixem tocar, interpelar e instigar por estas palavras do Senhor: «por isto é que todos conhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros» (Jo 13, 35).

No caso dos presbíteros, o amor fraterno não se restringe a um pequeno grupo, mas exprime-se como caridade pastoral (cf. Exort. ap. pós-sin. Pastores dabo vobis, 23), que impele a vivê-lo concretamente na missão. Podemos dizer que amamos, se aprendermos a expressá-lo como o descreve São Paulo. E só quem procura amar é que está em segurança. Quem vive com a síndrome de Caim, na convicção de não poder amar porque sente continuamente que não foi amado, valorizado, tido na devida consideração, acaba por viver sempre como um errante, sem nunca se sentir em casa, e por isso mesmo está mais exposto ao mal: a fazer-se mal e a fazer mal. Por isso o amor entre os presbíteros tem a função de guardar, de se guardarem mutuamente.

Atrevo-me a dizer que, onde reina a fraternidade sacerdotal, a proximidade entre os padres, e existem laços de verdadeira amizade, é possível viver com mais serenidade também a opção celibatária. O celibato é um dom que a Igreja latina guarda; mas, para ser vivido como santificação, necessita de relações sadias, relações de verdadeira estima apostando no bem autêntico, cuja raiz está em Cristo. Sem amigos e sem oração, o celibato pode tornar-se um peso insuportável e um contratestemunho da própria beleza do sacerdócio.

Agora chegamos à quarta e última proximidade: a proximidade com o Povo de Deus, com o santo Povo fiel de Deus. Ser-nos-á útil ler os números 8 e 12 da Lumen gentium.

Proximidade com o povo

Tenho assinalado, com frequência, como a relação com o santo Povo de Deus seja para cada um de nós, não um dever, mas uma graça. «O amor às pessoas é uma força espiritual que favorece o encontro em plenitude com Deus» (Evangelii gaudium, 272). É por isso que o lugar de cada sacerdote é no meio das pessoas, numa relação de proximidade com o povo. Salientei na Exortação Evangelii gaudium que, «para ser evangelizadores com espírito, é preciso também desenvolver o prazer espiritual de estar próximo da vida das pessoas, até chegar a descobrir que isto se torna fonte de uma alegria superior. A missão é uma paixão por Jesus, e simultaneamente uma paixão pelo seu povo. Quando paramos diante de Jesus crucificado, reconhecemos todo o seu amor que nos dignifica e sustenta, mas lá também, se não formos cegos, começamos a perceber que este olhar de Jesus se alonga e dirige, cheio de afeto e ardor, a todo o seu povo fiel. Lá descobrimos novamente que Ele quer servir-se de nós para chegar cada vez mais perto do seu povo amado. Jesus quer servir-se dos sacerdotes para ficar mais próximo do santo Povo fiel de Deus. Toma-nos do meio do povo e envia-nos ao povo, de tal modo que a nossa identidade não se compreende sem esta pertença» (Ibid., 268). A identidade sacerdotal não se pode perceber sem esta pertença ao santo Povo fiel de Deus.

Tenho a certeza de que hoje, para se compreender de novo a identidade do sacerdócio, é importante viver em estreita ligação com a vida real das pessoas, ao lado delas, sem qualquer via de fuga. «Às vezes sentimos a tentação de ser cristãos, mantendo uma prudente distância das chagas do Senhor. Mas Jesus quer que toquemos a miséria humana, que toquemos a carne sofredora dos outros. Espera que renunciemos a procurar aqueles abrigos pessoais ou comunitários que permitem manter-nos à distância do nó do drama humano, a fim de aceitarmos verdadeiramente entrar em contacto com a vida concreta dos outros e conhecermos a força da ternura. Quando o fazemos, a vida complica-se sempre maravilhosamente e vivemos a intensa experiência de ser povo, a experiência de pertencer a um povo» (Ibid., 270). E o povo não é uma categoria lógica; é uma categoria mítica; para o entender, devemos aproximar-nos como fazemos com as categorias míticas.

Proximidade com o Povo de Deus. Uma proximidade que, enriquecida com as «outras proximidades», as outras três, convida e, em certa medida, exige dar continuidade ao estilo do Senhor, que é estilo de proximidade, compaixão e ternura, porque capaz de caminhar, não como um juiz, mas como o Bom Samaritano, que reconhece as feridas do seu povo, o sofrimento vivido em silêncio, a abnegação e os sacrifícios de tantos pais e mães para manter as suas famílias, e também as consequências da violência, da corrupção e da indiferença, cuja passagem procura silenciar toda a esperança. Uma proximidade que permite ungir as feridas e proclamar um ano da graça do Senhor (cf. Is 61, 2). É decisivo lembrar-se que o Povo de Deus espera encontrar pastores com o estilo de Jesus e não “clérigos de Estado” (recordamos aquela época na França em que havia o cura de Ars, o cura, mas havia também “monsieur l’abbé”, clérigos de Estado). Também hoje o povo pede-nos pastores do povo e não “clérigos de Estado” nem “profissionais do sagrado”; pastores que se entendam de compaixão, de oportunidade; homens corajosos, capazes de parar junto de quem está ferido e estender-lhe a mão; homens contemplativos que possam, na proximidade com o seu povo, anunciar nas chagas do mundo a força operante da Ressurreição.

Uma das caraterísticas cruciais de nossa sociedade “em rede” é que abunda o sentimento de orfandade. Trata-se de um fenómeno atual. Ligados a tudo e a todos, falta-nos a experiência da pertença, que é muito mais do que uma conexão. Com a proximidade do pastor, pode-se convocar a comunidade e favorecer o crescimento do sentido de pertença; pertencemos ao santo Povo fiel de Deus, que é chamado a ser sinal da irrupção do Reino de Deus no momento presente da história. Se o pastor se extraviar, se o pastor se afastar, também as ovelhas se dispersarão acabando ao alcance de todo e qualquer lobo.

Por sua vez, esta pertença proporcionará o antídoto contra uma deformação da vocação, que deriva precisamente do facto de esquecer que se deve a vida sacerdotal aos outros, ou seja, ao Senhor e às pessoas que estão confiadas ao padre. Este esquecimento está na base do clericalismo – de que falou o Cardeal Ouellet — e das suas consequências. O clericalismo é uma perversão. E um dos seus sinais — a rigidez — é outra perversão. O clericalismo é uma perversão, porque se constitui com base no «distanciamento». Curioso! Não sobre as proximidades, mas sobre o contrário! Quando penso no clericalismo, vem-me ao pensamento também a clericalização do laicado, ou seja, a promoção de uma pequena elite que, ao redor do padre, acaba inclusivamente por desnaturar a sua missão fundamental (cf. Gaudium et spes, 44): a do fiel leigo. Há tantos leigos clericalizados, tantos: “Eu sou de tal associação, estamos em tal paróquia, somos…”, os “eleitos”, leigos clericalizados: é uma tremenda tentação! Recordemos que «a missão no coração do povo não é uma parte da minha vida, ou um ornamento que posso pôr de lado; não é um apêndice ou um momento entre tantos outros da minha vida. É algo que não posso arrancar do meu ser [sacerdotal], se não me quero destruir. Eu sou uma missão nesta terra, e para isso estou neste mundo. É preciso considerar-nos como marcados a fogo por esta missão de iluminar, abençoar, vivificar, levantar, curar, libertar» (Evangelii gaudium, 273).

Gostaria de relacionar esta proximidade com o Povo de Deus e a proximidade com Deus, porque a oração do pastor se nutre e encarna no coração do Povo de Deus. Quando reza, o pastor carrega consigo os sinais das feridas e das alegrias do seu povo, que apresenta em silêncio ao Senhor para que as unja com o dom do Espírito Santo. Está aqui a esperança do pastor, que tem confiança e luta para que o Senhor abençoe o seu povo.

Seguindo o ensinamento de Santo Inácio, segundo o qual «não é o muito saber que sacia e satisfaz a alma, mas o sentir e saborear interiormente as coisas» (Exercícios Espirituais, Anotações, 2, 4), será útil aos bispos e presbíteros interrogarem-se: “Como estão as minhas proximidades?”. Como estou a viver estas quatro dimensões do meu ser sacerdotal que o configuram transversalmente e me consentem gerir as tensões e os desequilíbrios com que tenho de lidar diariamente? Estas quatro proximidades são uma boa escola para jogar a todo o campo na realidade concreta onde o sacerdote é chamado, sem medo, sem rigidez, sem reduzir nem empobrecer a missão. Um coração sacerdotal percebe de proximidades, porque o primeiro que quis estar próximo foi o Senhor. Que Ele visite os seus sacerdotes na oração, no bispo, nos irmãos presbíteros e no seu povo. Quebre a rotina e disturbe um pouco, desperte inquietações — como no tempo do primeiro amor — ponha em movimento todas as capacidades a fim de que o nosso povo tenha vida e vida em abundância (cf. Jo 10, 10). A proximidade com o Senhor não é uma nova tarefa, mas um dom que Ele concede para se manter viva e fecunda a vocação. A proximidade com Deus, a proximidade com o bispo, a proximidade entre nós, sacerdotes, e a proximidade com o santo Povo fiel de Deus.

Vendo a tentação de nos fecharmos em discursos e discussões intermináveis acerca da teologia do sacerdócio ou sobre as teorias do que deveria ser, o Senhor olha com ternura e compaixão para os sacerdotes, oferecendo-lhes as coordenadas a partir das quais hão de reconhecer e manter vivo o ardor pela missão: proximidade que é compassiva e terna, proximidade com Deus, com o bispo, com os irmãos presbíteros e com o povo que lhes foi confiado. Uma proximidade com o estilo de Deus, que Se aproxima com compaixão e ternura.

E obrigado a todos vós pela vossa proximidade e a vossa paciência! Obrigado, muito obrigado! Bom trabalho a todos. Vou à Biblioteca, porque tenho muitos encontros esta manhã. Rezai por mim e eu rezarei por vós. Bom trabalho!

[Bênção].