«José com o seu silêncio convida-nos a deixar espaço para a presença da Palavra feita carne», afirmou o Papa Francisco na audiência geral de quarta-feira, 15 de dezembro, na Sala Paulo vi continuando a catequese sobre a figura do esposo de Maria e comentando o seu aspeto de «homem do silêncio».
Estimados irmãos e irmãs
bom dia!
Continuemos o nosso caminho de reflexão sobre São José. Depois de ter ilustrado o ambiente em que ele viveu, o seu papel na história da salvação e o seu ser justo e esposo de Maria, hoje gostaria de examinar outro aspeto importante da sua figura: o silêncio. Hoje, muitas vezes precisamos de silêncio. O silêncio é importante. Estou impressionado com um versículo do Livro da Sabedoria que foi lido a pensar no Natal, que diz: “Quando a noite estava no silêncio mais profundo, a tua palavra desceu à terra”. No momento de maior silêncio Deus manifestou-se. É importante pensar no silêncio nesta época na qual ele parece ter tão pouco valor.
Os Evangelhos não registam quaisquer palavras de José de Nazaré, nada, nunca falou. Isto não significa que ele fosse taciturno, não, há uma razão mais profunda. Com este silêncio, José confirma o que Santo Agostinho escreveu: «Na medida em que cresce em nós a Palavra — o Verbo que se fez homem — diminuem as palavras» (Sermão 288, 5: pl 38, 1307). Na medida em que Jesus — a vida espiritual — cresce, as palavras diminuem. Isto que podemos definir o “papagalismo” — falar como papagaios continuamente — diminui um pouco. João Batista, que é «a voz que clama no deserto: “Preparai o caminho do Senhor”» (Mt 3, 1), diz em relação ao Verbo: «Ele deve crescer e eu diminuir» (Jo 3, 30). Significa que Ele deve falar e eu devo ficar calado e José com o seu silêncio convida-nos a deixar espaço à Presença da Palavra feita carne, a Jesus.
O silêncio de José não é mutismo; é um silêncio cheio de escuta, um silêncio laborioso, um silêncio que faz emergir a sua grande interioridade. «O Pai pronunciou uma palavra, e foi o seu Filho — comentou São João da Cruz — e ela fala sempre em eterno silêncio, e no silêncio deve ser ouvida pela alma» (Dichos de luz y amor, bac , Madrid, 417, n. 99).
Jesus cresceu nesta “escola”, na casa de Nazaré, com o exemplo diário de Maria e José. E não surpreende que ele próprio procurará espaços de silêncio nos seus dias (cf. Mt 14, 23) e convidará os seus discípulos a fazerem esta experiência, por exemplo: «Vinde, retiremo-nos a um lugar deserto, e repousai um pouco» (Mc 6, 31).
Como seria bom se cada um de nós, seguindo o exemplo de São José, conseguisse recuperar esta dimensão contemplativa da vida aberta precisamente pelo silêncio. Mas todos sabemos por experiência que não é fácil: o silêncio assusta-nos um pouco, porque nos pede para entrarmos em nós mesmos e encontrarmos a parte mais verdadeira de nós. Muita gente tem receio do silêncio, deve falar, falar, falar ou ouvir rádio, televisão…, mas não pode aceitar o silêncio porque tem medo. O filósofo Pascal observou que «toda a infelicidade dos homens provém de uma só coisa: não saber ficar tranquilo num quarto» (Pensamentos, 139).
Queridos irmãos e irmãs, aprendamos de São José a cultivar espaços de silêncio, nos quais possa surgir outra Palavra, isto é, Jesus, a Palavra: a do Espírito Santo que habita em nós e que traz Jesus. Não é fácil reconhecer esta Voz, que muitas vezes se confunde com os milhares de vozes de preocupações, tentações, desejos e esperanças que nos habitam; mas sem este treino que provém precisamente da prática do silêncio, até a nossa fala pode adoecer. Sem a prática do silêncio o nosso falar adoece. Ele, em vez de fazer resplandecer a verdade, pode tornar-se uma arma perigosa. De facto, as nossas palavras podem tornar-se adulação, jactância, mentira, maledicência, calúnia. É um dado da experiência que, como nos lembra o Eclesiástico, «a língua mata mais do que a espada» (28, 18). Jesus disse-o claramente: quem fala mal do irmão ou da irmã, quem calunia o próximo, é homicida (cf. Mt 5, 21-22). Mata com a língua. Não acreditamos nisto, mas é a verdade. Recordemos as vezes que matamos com a língua, envergonhar-nos-íamos! Contudo, far-nos-á muito bem, tanto bem.
A sabedoria bíblica afirma que «morte e vida estão no poder da língua: quem fizer bom uso dela comerá o seu fruto» (Pr 18, 21). E o apóstolo Tiago, na sua Carta, desenvolve este antigo tema do poder, positivo e negativo, da palavra com exemplos impressionantes, diz assim: «Se alguém não peca pela palavra, esse é um homem perfeito, capaz de dominar o seu corpo [...] a língua é um pequeno membro e gloria-se de grandes coisas [...] Com ela bendizemos a Deus Pai, e com ela amaldiçoamos os homens, feitos à semelhança de Deus. De uma mesma boca procedem a bênção e a maldição» (3, 2-10).
Por este motivo, devemos aprender de José a cultivar o silêncio: aquele espaço de interioridade nos nossos dias nos quais damos ao Espírito a oportunidade de nos regenerar, de nos consolar, de nos corrigir. Não estou a dizer que devemos cair num mutismo, não, mas devemos cultivar o silêncio. Cada um olhe para dentro de si mesmo: muitas vezes estamos a fazer um trabalho e quando terminamos procuramos imediatamente o telemóvel para fazer outra coisa, somos sempre assim. E isto não ajuda, faz-nos escorregar para a superficialidade. A profundidade do coração cresce com o silêncio, um silêncio que não é mutismo, como eu disse, mas que deixa espaço à sabedoria, à reflexão e ao Espírito Santo. Por vezes temos medo dos momentos de silêncio, mas não devemos recear! O silêncio far-nos-á muito bem. E o benefício para o coração curará também a nossa língua, as nossas palavras e, sobretudo, as nossas escolhas. Com efeito, José uniu o silêncio à ação. Ele não falou, mas fez, e assim mostrou-nos o que Jesus disse outrora aos seus discípulos: «Nem todo o que me diz Senhor, Senhor, entrará no reino dos Céus, mas sim aquele que faz a vontade do meu Pai que está nos Céus» (Mt 7, 21). Palavras fecundas quando falamos e temos a recordação daquela canção “Parole, parole, parole…” [“Palavras, palavras, palavras…”] e nenhuma substância. Silêncio, falar o suficiente, às vezes morder a língua um pouquinho, que faz bem, em vez de dizer parvoíces.
Concluamos com uma oração:
São José, homem do silêncio,
vós que no Evangelho
não proferistes palavra alguma,
ensinai-nos a jejuar
de palavras vãs, a redescobrir
o valor das palavras
que edificam, encorajam,
consolam e apoiam.
Estai próximo de quantos sofrem
por causa das palavras que
ferem, como as calúnias
e as maledicências, e ajudai-nos
a unir sempre as ações
às palavras. Amém!