Em 1955 o escritor inglês C.S. Lewis, há pouco tempo viúvo devido à morte prematura da sua esposa doente de cancro, escreveu ao seu amigo Malcolm, gravemente doente, uma carta para o consolar e contar-lhe a paixão de Jesus, abandonado por todos, flagelado e injustamente condenado à morte, tão só que na cruz as suas palavras dirigidas ao Pai são «Meu Deus, por que me abandonaste?». Uma forma verdadeiramente singular de consolação.
Tempos antes, a Jesus tinha sido dirigida uma pergunta cheia de angústia, a pergunta sobre a morte: «não Te importas que pereçamos?". São os discípulos que acordam Jesus que está a dormir na popa do barco à mercê da tempestade no Lago de Tiberíades. O Papa Francisco insistiu sobre esta cena narrada pelo Evangelho de Marcos e repetiu esta pergunta várias vezes no seu discurso pronunciado ontem à tarde na Praça de São Pedro. Depois o Papa rezou diante do ícone da Salus populi Romani e diante do crucifixo da igreja de São Marcelo transportado para a ocasião e colocado ali na praça, em frente da Basílica, debaixo da chuva. No rosto de madeira contorcido pela dor parece estar a pergunta: «Não vos importais que eu pereça?». Jesus morreu sozinho, condenado pelo seu povo, abandonado pelos seus amigos. Ele morreu sozinho e pelos sofrimentos atrozes causados não só pelas suas feridas mas, antes de mais nada, pelo sufocamento devido ao facto de ter sido pregado na cruz. Um crucificado morre de asfixia. Ontem quase mil pessoas na Itália morreram de coronavírus, morreram sozinhas e por asfixia, sem fôlego. O aspeto mais atroz desta pandemia reside precisamente na solidão a que ela nos condena a viver e sobretudo a morrer. Tudo isto assusta os homens, mas ao cristão, além do medo, confere misteriosamente algo mais. O cristão sabe que é Jesus que continua a sofrer nestes irmãos e irmãs, como se estivesse a cumprir o que falta aos seus padecimentos (Cl 1, 24).
No final daquela carta a Malcolm, em 1955, Lewis concluiu: «Estou convencido de que o que tu e eu podemos realmente compartilhar neste momento é apenas a escuridão; compartilhá-la entre nós e, o que mais importa, com o nosso Mestre. Não estamos numa vereda ainda não percorrida, mas antes de tudo, no caminho principal».
Andrea Monda